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quarta-feira, agosto 17, 2011

Carta para Ortros

























quis o destino dar-te duas cabeças e um só coração
ao fazer isso te fadou a procurar amores racionais
em qualquer balança se equilibrariam teu amor e tua razão
seria perfeito se isso não fosse tão doloroso

ser um cão bicéfalo, com rabo de serpente
e aparência estranha sempre em alerta
pronto para atacar com tuas verdades
não te salvou de si mesmo, nem de teus sentimentos

nada conseguiu evitar que trouxesse tuas verdades
como mantos de proteção e pureza
como estandarte e brasão de guerreiros
que são avaliados pela honra de espírito e força de luta

de onde venho tuas verdades valem muito pouco
no máximo comprariam vários inimigos
e contas de olhos malfeitores e línguas maledicentes
nasci no meio de invencionices crônicas
numa terra onde só vale a mentira
e as representações grotescas da verdade
nada fácil de equilibrar

olho para teu irmão, Cérbero, o cão de três faces,
aquele com três pares de olhos e orelhas
e com três mordeduras à mostra, prontas para destroçar
qualquer coisa que venha contra suas regras
só aquele cão que guardava Hades
estava pronto para o mundo

e ali, em Eritéia, bem longe dos portões do inferno
fora domado e domesticado por Gerião
um agricultor que te fez pacífico vigia de rebanhos

Hércules, em seu décimo trabalho, ao golpear-te mortalmente
mal supunha quão grande e sensível era seu coração
se o soubesse, não ousaria destroçar o brilho de tua pulsante alma
que ascendeu aos céus como Sírius a contar histórias

a mais bela e brilhante estrela do céu noturno

e ao descobrir-te tão intenso e verdadeiro
naquele céu onde cometas se travestiam de estrelas
onde corpos celestes embusteiros se jogavam
desaprendi a dividir olhares e choro

naquela noite descobri quão pobre seria meu destino
uma pobre Sherazade a contar histórias sem fim
numa dessas mil e uma noites.


(resposta para Carta para Úrano, de Wile Ortros:
http://wileortros.blogspot.com/2011/08/carta-para-urano.html )

segunda-feira, agosto 15, 2011

arauto





















navegaria
através de tempestades
se não fosse tão incrédula
e presa a esse tempo

se o fizesse
por ti, meu amado
minha nau não
teria porto algum

o oceano me levaria
a vastas latitudes
e me esqueceria
das longitudes

sem bússola me perderia
na imensidão do caos
e a arrebentação
me enganaria

as âncoras
seriam içadas
só no fim

náufragas as palavras
só fariam par
com as pedras
e algas no fundo
do mar

ali sim,
o mais belo silêncio
e o vazio igual a espera
desse momento
nós.

terça-feira, agosto 02, 2011

Indomável






















Minha alma transpirava estrelas
Procurei, mas não pude vê-las,
Estava de olhos fechados a te sentir
Ainda sim podia senti-lo sorrir
Dentro de mim.
Um vulgo jardim se formava
Enquanto estava despetalada
Em teu leito ferido
Indomável
Como uma onda de luxúria
Como um vulcão entre minhas pernas
Como um vendaval de sentidos
Enchia-me teu negro noturno
E com astros luminosos
Imperadores, incandescentes,
Que nos faziam átomos
Na conjugação de verbos imperfeitos.